Não está tudo bem, nem para os optimistas!

09-11-2020

    

    O pensamento optimista caracteriza-se por, dentro das inúmeras possibilidades de cursos e desfechos positivos ou dramáticos, dedicar mais convicção, tempo de antena, reflexão e energia aos positivos. Há uma fase inicial que implica algum esforço e que se prende com sair e resistir à tendência mais impulsiva e natural do ser humano de, pelo seu instinto básico e essencial de sobrevivência, identificar mais imediatamente tudo aquilo que lhe pode causar dano e dor. Um optimista aprende a continuar a reflexão para além deste "prepara-te para morrer" inicial e a elaborar todas as outras infinitas possibilidades de a situação não ser tão danosa como o instinto nos alarma e poder até concretizar-se o acaso de se verificarem os cenários mais positivos. Um optimista não é um irrealista ou desrealizado mas, sabendo que há várias alternativas e possibilidades, decide focar-se nas que não antecipam os potenciais desfechos dramáticos. Embora por vezes os dramas aconteçam, há sempre um processo que nasce quando uma situação ou ciclo se fecha e se se mantém esta orientação, mantém-se também o optimismo, mesmo em cenários exigentes e dolorosos.

    A pandemia está a tornar-se exigente, mesmo para os optimistas! Clarifique-se que aqui não há qualquer referência ou enquadramento daqueles que negam ou minimizam o impacto e gravidade da doença em si e das suas consequências. Esses são os irrealistas ou desrealizados, não optimistas funcionais.

    Um optimista funcional, nestas circunstância, acreditará que não são necessárias medidas tão radicais e limitadoras das liberdades mas debate-se com os números que pioram de dia para dia... Um optimista acreditará que há uma oportunidade das comunidades se interajudarem mais e assim saírem mais coesas e resilientes disto tudo, mas confronta-se com a tensão entre pessoas com posições radicalizadas e que se atacam mutua e agressivamente... Um optimista acredita que a pandemia terá uma vida limitada e desaparecerá em breve mas este breve começa a ser longo o suficiente para percebermos impactos que demoraremos largos anos a superar e recuperar...

    As circunstâncias não estão fáceis, mesmo para os optimistas! Quer a pandemia, quer os seus impactos colaterais, quer o que está a trazer às relações humanas, deixa-nos num estado de apreensão inevitável.

    Os optimistas estão a ser postos à prova e assumem um papel muito relevante em trazer algum equilíbrio e calma ao caos comunicacional a que se vai assistindo... Vejo como caminho o recolhimento consciente e o abraçar de algum silêncio, pacatez e uma imensa empatia. Queremos todos o mesmo mas dependendo do contexto em que vivemos, cada um prioriza uma das dimensões. Mas queremos todos o mesmo, ultrapassar isto com o menor impacto possível. Queremos todos voltar à liberdade, sobretudo à liberdade de estarmos com quem amamos e de convivermos sem receios com todos aqueles com que nos cruzamos.

    Podemos ainda tentar aproveitar esta fase para silenciar os tumultos internos e assim contribuir para a paz externa. Vermos e falarmos com empatia face à posição e perspectiva dos outros. Recolhermo-nos aos nossos núcleos familiares e vivê-los com presença. Continuar a agir em contribuição positiva para com a nossa comunidade. Perguntarmos ao vizinho se precisa de alguma coisa, comprar na mercearia do bairro, encomendar refeições no restaurante da aldeia... passar a viver mais no meio envolvente imediato. "Voar" menos para longe e ficar mais tempo e mais devagar nos caminhos que nos rodeiam as casas... a imensidão do mundo estará disponível para nós, quando tudo isto passar. Por agora, continuar a viver mas redimensionar os contextos diários, intensificar a importância e minimizar quantidades, resguardarmo-nos na medida do possível. Com esse foco recolocado, manter o optimismo. Se a minha relação com o meu vizinho se tornar mais próxima, se a mercearia do meu bairro puder sobreviver, se o restaurante da minha aldeia sentir o meu apoio, se a minha família nuclear me sentir presente e inteira... se a energia estiver preservada e orientada para gerar o bem no meio ambiente imediato, posso continuar a ver possibilidade de desfechos positivos. 

    E precisamos tanto desses vislumbres internos de alguma esperança.   

© 2020 Patrícia Labandeiro. Todos os direitos reservados.
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