Caminho de Santiago - a mais bela metáfora para a Vida!
Porque caminho uma e outra vez em direção ao Apóstolo Santiago? Porque os significados do que se vive no Caminho, me ensinam tanto sobre a vida...
O caminho é sobre simplicidade, é sobre ficarmos todos "reduzidos" (aliás, engrandecidos) à nossa essência humana, sem levarmos estatutos, títulos e diferenças de poder financeiro. Somos todos peregrinos e por vezes falamos sobre questões profundas e partilhamos experiências que nos marcaram sem passarmos pelo habitual (e por vezes superficial) código social de conhecimento mútuo (Que idade tens? O que fazes? És casado? Já tens filhos? ...). Recordo algumas conversas que me marcaram, com peregrinos sobre os quais nem o nome soube...
É sobre confiarmos nos outros de quem por vezes apenas sabemos uma coisa: peregrinos como nós. Pernoitamos num espaço comum, expomo-nos na intimidade do nosso sono, ouvimos a respiração uns dos outros (e por vezes o ressonar, é verdade!)... Assim, vulneráveis uns aos outros, a respirar em uníssono e a confiar que estamos em segurança, uns com os outros.
O caminho é sobre partirmos com o essencial, aprender a reconhecer o que é necessário e o que é acessório (e que bom é ficarmos com essa visão nas nossas vidas quotidianas cheias de coisas). Todos os peregrinos têm esta experiência de redução sucessiva (e natural) dos quilogramas que transportam de cada vez que se põem a Caminho. O processo de deixar ficar objetos que no dia a dia nos parecem tão indispensáveis e de reduzir drasticamente o número de calças ou t-shirts disponíveis durante uma série de dias, ajuda-nos a relativizar a noção de necessidade... O tal desapego material que nos liberta e nos dá espaço para dar mais atenção ao que vai dentro de nós e que, isso sim, é crucial para a vivência do caminho.
O caminho é sobre religião, ou não... é sobre
espiritualidade, ou não... é sobre fé, com toda a certeza! Não precisamos de ser
Cristãos nem crentes em qualquer religião ou dimensão espiritual da existência
para o fazer e absorver o impacto mais profundo que pode deixar. Se vamos sem
fé, há uma grande probabilidade de a encontrarmos... quanto mais não seja, a fé
em nós próprios e na humanidade.
O caminho é sobre descobrires os teus próprios
recursos (e passares a ter fé neles), enfrentares alguns medos e caminhares sem
a certeza do que aí vem. Existe um plano, simples, caminhar. Mas não sabes quem
vais encontrar, quanto tempo demorarás a chegar ao destino, quando vai chegar a
dor... quem vais descobrir que és nesse momento de dor e incerteza. Nesse momento
em que vais questionar o que estás ali a fazer e que sentido faz. Nesse
momento, descobrirás alguma coisa sobre ti (e sobre quem te acompanha). Algo que
não sabias à partida.
O caminho é sobre encontros inesperados,
conversas improváveis e memórias do caricato. O mundo é diverso, as pessoas têm
idiossincrasias interessantes, a natureza reserva surpresas, o teu corpo vai
comunicar contigo de novas formas... se estiveres aberto a absorver o que vem,
haverá momentos marcantes!
O caminho é, para mim, sobre liberdade, fé,
simplicidade e partilha. Sobre o silêncio que acaba por te permitir
confrontares com o ruído interno, com as mil vozes que nos desassossegam, com o
redemoinho da nossa incessante narrativa... até que se "esgota" e, por momentos,
voltas ao silêncio (num outro nível e com outra entrega). E então, percebes
finalmente o que é o silêncio e guardas esse porto-de-abrigo em ti, para quando
o mundo estiver a gritar e tu precisares de te ouvir. Fica em ti, uma nova
dimensão do silêncio interno.
Costumo dizer que é a
mais bela metáfora da e para vida... Como se "tudo" o que preciso de aprender para os desafios da
vida possam estar presentes, metaforicamente, em tudo o que vivo no caminho.
Com os outros e comigo própria.